* O
Esporte Alto Vale agradece a gentileza do Jornal Folha do Alto Vale, através do
editor chefe Orlando Pereira, e do repórter Clóvis Cuco por terem liberado a publicação da
reportagem abaixo. A matéria foi veiculada no jornal na última sexta-feira (24.02).
Texto e fotos de Clóvis Eduardo Cuco
Atletas
jovens ou experientes tem a chance de mostrar que em Rio do Sul, o vôlei
significa muito mais do que o ginásio cheio uma vez por semana.
O grito que vem da arquibancada vem mais
alto da quadra. É só conferir um jogo da equipe de voleibol em Rio do Sul na
Superliga Feminina. Não há dúvidas que no primeiro ano na elite do vôlei
nacional, o time Rio do Sul/Unimed/Delsoft conquistou mais do que pontos
importantes na classificação. Uniu um grupo de 17 atletas estreantes ou
experientes capaz de dar grandes exemplos para a cidade que as acolheu desde o
início do campeonato.
De manhã, um grupo faz academia e o
outro tem trabalho específico. À tarde, não há como fugir de dezenas, talvez
centenas de cortadas, bloqueios, manchetes ou levantamentos por cerca de duas
horas. Mesmo no início do anoitecer de verão, o clima é quente, desconfortável
e tem as boladas de todo o lado. Ninguém mostra estar preocupado com isso, mas
que é cansativo, não dá de negar. O técnico é Rogério Portela, 10 Superligas
nas costas. Paciente, explica a jogada que quer, pergunta se alguém não
entendeu. A paciência está a seu favor, pois ele cobra e cobra muito. Em jogo,
enquanto um ponto suado vira uma comemoração vibrante pela equipe, Portela está
lá, ao lado da quadra, sério, concentrado e pronto para lembrar que é preciso
mais.
Em 10 anos de Superliga, Portela nunca viu uma parceria tão forte entre time e torcida |
O treinador sabe que a rotina de dois
jogos por semana, treinos, viagens, e o desejo de crescer cada vez mais na
competição gera um bônus, uma satisfação de ver que é possível ser competitivo.
Mas ao mesmo tempo, o ônus é a dor, o receio de colocar em quadra uma jogadora
que não está 100%, mas tem vontade de dar tudo de si para o time de Rio do Sul.
“A estrutura é boa, apresentamos um bom crescimento na competição, temos o
apoio da torcida e elas têm força de vontade. Eu estou superfeliz com todo este
projeto que vem sendo realizado”.
E as surpresas apareceram na mesma
rapidez com que o time foi montado. Mayhara Francini da Silva, por exemplo,
meio de rede, está na terceira Superliga, mas a primeira como jogadora atuante,
sem estar no banco ou apenas na arquibancada. Mayhara dá canseira, não só nos
narradores esportivos que tem de impostar a voz no “h” do nome, mas pelo número
de vezes que cravou bolas na quadra adversária neste campeonato. Foram 193 até
a sexta rodada do returno, conferindo-lhe a 15ª melhor marca da Superliga, na
frente de grandes estrelas do esporte como as experientes Paula Pequeno (Vôlei
Futuro), Mari (Unilever), Thaísa (Sollys) e Elisângela (SESI). E isso que ela
perdeu dois jogos por contusão. Uma lesão que confessa ainda sente de leve, mas
a permite estar em quadra pronta para o que o treinador Rogério Portela
precisar.
A dona da bola: Mayhara já pontuou mais do que muita estrela da seleção |
Estudou educação física por um ano, mas
parou. O foco no vôlei é 100% em sua vida, mas quer voltar para a faculdade.
Nasceu em Bauru (SP), tem 22 anos e aos 17 saiu de casa em busca do sonho de
ser jogadora de vôlei. Fã do técnico Bernardinho, busca inspiração nas colegas
de posição Valeskinha (Unilever) e de Waleska (Vôlei Futuro) para tentar chegar
a um sonho concorrido, mas possível: ser uma atleta de ponta e estar na seleção
brasileira. Capacidade é possível que tenha, já que Mayhara em sua primeira
Superliga na quadra, já tem mais pontos do que as duas atletas em que se
espelha.
“Um passo de cada vez, claro. Mas tenho força de vontade e determinação. Devo fazer aquilo que tenho prazer que é jogar voleibol”, argumenta a jogadora, que se não fosse atleta, queria ser veterinária, ou trabalhar com estética. Por enquanto, os animais, salões ou clínicas terão de aguardar a paixão de Mayhara pelo vôlei terminar, o que pelo visto, deve demorar bastante.
“Um passo de cada vez, claro. Mas tenho força de vontade e determinação. Devo fazer aquilo que tenho prazer que é jogar voleibol”, argumenta a jogadora, que se não fosse atleta, queria ser veterinária, ou trabalhar com estética. Por enquanto, os animais, salões ou clínicas terão de aguardar a paixão de Mayhara pelo vôlei terminar, o que pelo visto, deve demorar bastante.
A
menina do interior que apareceu na TV
Querer é poder. A expressão é antiga,
famosa. Há quem atribua a autoria a Shakespeare, ou só lembrada como o simples
verso de músicas populares. Fernando Pessoa contesta. “Se querer é poder, quem
pode, já se perdeu no querer”. De que adianta insistir, se muitos que querem,
não podem? Até deve ser verdade, mas, vai explicar isso para quem não tem
vontade de desistir.
“Mãe, um dia você vai me ver na TV”. A
frase ainda circula como uma feliz piada na família de Ana Paula Puglia
Larroza, que com 13 anos, queria ser jogadora de vôlei. Hoje, quase 19 anos
depois, quanta coisa aconteceu na vida da menina que saiu de Presidente
Bernardes, no oeste paulista, para hoje ter conquistado quase tudo o que
pretendia praticando esporte. Acompanhada de nove garotos da cidade, foi tentar
uma peneira em um clube profissional. Só ela foi aprovada.
Deixe que ela pega: Nine defende o time que tem união e se esforça em quadra |
Ana Paula já leva de tempo o apelido de
Nine. É a líbero na equipe de Rio do Sul que disputa a Superliga com tanta
vontade como se fosse a primeira vez, ou talvez, a última. Do futuro, pouco
pode prever, mas do passado, tem orgulho de cada gota de suor deixada na camisa
15. Prestes a completar 32 anos, Nine sabe que o corpo já não responde da mesma
forma como no início, e que o rendimento cairá gradualmente. Prevê ao menos
mais dois ou três anos de quadra, tempo suficiente para deixar um exemplo para
as companheiras que estão no início de carreira e sonham com fama, fortuna e
reconhecimento.
“Com
20 anos, eu dormia e acordava pensando em voleibol, era muito focada”. Hoje, a
forma de pensar mudou, ficou mais leve, mas ao mesmo tempo, não dá de dizer que
ela não tenha “sangue nos olhos” pelo esporte. Tem sim. E a vontade e dedicação
de não deixar a bola cair gerou resultados e estatísticas impressionantes. Foi
eleita por duas vezes a melhor líbero da rodada da competição, mesmo com
adversárias de destaque na posição como Fabi, (Unilever), que é titular na
seleção brasileira e a americana Stacy (Vôlei Futuro). Fechou o primeiro turno
da Superliga como a sétima melhor recepção entre todas as jogadoras inscritas.
Vibrante em quadra, Nine contagia
companheiras de time e torcida. “Uma puxa a outra, costumo ser alegre, dou bom
dia para todo mundo. Quando chego de uma forma diferente, já começam a achar
que tem algo errado”. Durante o jogo, tem que se concentrar, mas não deixa de
explodir quando uma jogada dá certo. “A gente treina muito e acredito que com
determinação, atitude, confiança em você mesma e nas companheiras, a gente pode
ser vencedor”. Apesar da campanha que Rio do Sul faz na primeira participação
na Superliga, com três vitórias em 17 jogos, tanto o treinador Rogério Portela,
como as jogadoras mostram que há muito que comemorar. “Nosso time está integrado,
se ajuda, se cobra, tem espírito de equipe. Isso é uma conquista imensa”,
avalia a líbero. Claro que, mesmo uma das mais experientes em quadra, admite
ficar de cabeça quente com um jogo perdido. “Há derrotas e derrotas, mas sempre
me pergunto: o que poderia ter feito a mais para evitar isso?”.
Vibra que vale a pena: com quase 32 anos, a líbero ainda quer jogar mais |
Dor
física e saudade se misturam
A carreira quase no fim, não foi fácil.
Já ficou tempo desempregada e um dos clubes que já jogou simplesmente não
honrou mais os compromissos no meio de um campeonato. Com as dificuldades,
aprendeu que nada vem sem muito esforço. A própria chegada ao clube Menorca na
Espanha, o auge da carreira, foi das experiências mais curiosas, pois achava
que teria ao menos uns dias para adaptação ao ambiente, às companheiras de
clube e ao difícil dialeto local que mistura francês, inglês, catalão,
português e espanhol. “Cheguei do aeroporto e fui para o ginásio conhecer tudo
e o treinador disse: esse é o teu material e precisamos de você. Vá jogar
agora!”.
Dedicação em excesso pode causar problemas
graves. Chorava de dor em casa por causa de um problema sério na coxa direita,
quando jogava no Praia Clube e mesmo assim não deixava de estar em quadra.
Outro problema, uma ruptura no músculo posterior na coxa esquerda anos antes no
São Caetano, significou três meses sem jogar. Isso para um atleta, em
campeonatos tão curtos como a Superliga, que dura em média quatro a cinco
meses, é uma eternidade.
Unhas coloridas, apaixonada por leitura,
cita a obra “O Monge que Vendeu sua Ferrari” de Robin Sharma como uma das
preferidas. Não vê outro caminho para se dar bem no esporte e na vida senão
através do treino, da dedicação, do esforço e do espírito de equipe. E faz uma
lembrança especial para as colegas de profissão ou para quem quer começar. “Não
deixem de estudar, pois a carreira no esporte é muito curta”.
Nine chama a líbero Fabi, do Unilever de
“fofa”, pois foi de uma atenção exemplar com os fãs quando esteve em Rio do Sul
há duas semanas. Mas ela mesma também mostra simpatia para atender os novos amigos
que fez em Santa Catarina. “O carinho aqui é tão grande. Essa é uma das
incríveis vantagens de se jogar vôlei profissionalmente. Você evolui, conhece
pessoas, lugares e faz aquilo que gosta”. E a maior desvantagem deste tipo de
vida? “É difícil ter companhia sabe? São tantas viagens, muito treino, muita
concentração. Ter um relacionamento sério que entenda este amor paralelo pelo
vôlei não é nada fácil”, comenta sorridente.
A Ana Paula que saiu de casa aos 13
anos, com o apoio da mãe e dos avós, superou dificuldades e experimentou várias
vezes o chamado “pão que o diabo amassou”. Deu sua contribuição e continua
fazendo seu papel na equipe do Alto Vale. Apesar do forte apego familiar, não
vê ninguém desde que se apresentou em Rio do Sul no início de dezembro do ano
passado e a saudade dos sobrinhos Leonardo e Artur só aumenta. O jeito de a
família matar um pouco a ansiedade de ver a jogadora é pela televisão. Alguns
dos jogos de Rio do Sul já foram transmitidos ao vivo para todo o país. E dona
Jussara, mãe de Nine, tem motivos para orgulhar-se da menina que aos 13 anos,
dizia que estaria em quadra disputando campeonatos importantes e seria
focalizada pelas câmeras. A menina cresceu e provou que a citação favorita é a
mais pura verdade. De fato, querer, para Nine, é poder.
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